UMA TAÇA DE OINOS COM MASTER SOMMELIER JOÃO PIRES - Serviço de Vinhos. Capítulo I

Um dos principais  objetivos  do  blog  "Oinos sem Mistério"  é educar todos aqueles que trabalham diariamente com o vinho. Temos publicado variados temas sobre serviço de vinhos e de como deve um sommelier, atuar perante os seus clientes.  Nos bastidores do Oinos sem Mistério existe uma discussão quase diária do que podemos fazer para melhorar o mundo do vinho e incentivar aqueles que gostam deste tema.  Em conversa como meu amigo João Pires, trocamos algumas opiniões a respeito das experiências que cada um de nós teve, comentei com ele sobre as necessidade que o Brasil passa na educação e na importância em  incentivar os profissionais  a  estudarem. João Pires para além de um amigo de longa data é para mim uma referência no mundo do vinho. Sem dúvida um dos melhores sommeliers do Mundo, que inspira todos os dias  jovens  à arte de bem servir. Gentilmente o João Pires cedeu um artigo que ele escreveu para a revista Wine em Portugal falando das suas experiências e opiniões. Li e reli o artigo e achei importantíssimo revelar a  opinião que ele têm, sobre a forma como o sommelier deve atuar nos dias de hoje.  Nós iremos publicar o artigo em três deliciosos capítulos, estejam atentos e boa leitura.

José Santanita.

João Pires, um Master  falando do serviço

DURANTE A REALIZAÇÃO de um estágio profissional levado a efeito em 1999 tive o privilégio de conhecer Claude Terrail - infelizmente já desaparecido, que à época era proprietário do famigerado restaurante parisiense fundado em 1582, La Tour d’Argent. Figura carismática, Monsieur Terrail tinha por hábito tomar as duas principais refeições do dia no patamar mais elevado do emblemático estabelecimento, que proporciona uma das vistas mais assombrosas sobre a Cidade Luz, sobranceiro que se encontra ao rio Sena e à catedral de Notre Dame, mais parecendo que o serpenteado caudal de água natural e a majestosa edificação religiosa de estilo gótico do século X rendem permanentemente homenagem a este verdadeiro santuário da gastronomia francesa e internacional. Invaria - velmente, antes de dar inicio às suas refeições, o Sr. Terrail fazia questão de deslocar-se às mesas para, um a um, cumprimentar todos os clientes, sem exceção. Foi então que percebi a razão pela qual a sua mesa se encontrava posicionada num lugar estratégico do restaurante. Com efeito, a partir dali era-lhe possível verificar quem chegava e partia, para além de poder auscultar também a reação contagiante da clientela. Devo no entanto confessar que só algum tempo mais tarde compreendi melhor o segredo de tal rotina e o facto de o sucesso granjeado pelo La Tour d`Argent ter vindo a consolidar-se ano após ano. De facto, o que o Sr. Terrail observava, logo em primeira instância, era o serviço. Não pretendo com isto referir-me, por exemplo, à forma como um determinado sommelier decantava o vinho ou à destreza irrepreensível com que o chefe de “rang” segmentava os ossos de pato. Antes, porém, ao fascínio dos clientes e à reação, simultaneamente de contentamento e espanto, espelhada nos seus rostos perante a magia de uma determinada composição gastronómica, bem como à alegria e emoção que a degustação de criações culinárias reveladoras de um enorme talento e sabor “exquisite” conseguem proporcionar, tão-bem expressas nas expectativas criadas pelos admiradores do La Tour d`Argent ao ambicionarem agendar um almoço ou jantar, como se da realização de um sonho se tratasse, apesar de saberem que essa mesma fantasia apenas se concretizaria ao fim de várias tentativas de reserva frustradas.  Em suma, o segredo não constava da copiosa Carta de Vinhos - com cerca de 500.000 garrafas sabiamente referenciadas e um “stock value” na ordem dos 25 milhões de euros! - nem tão-pouco se confinava à especialidade da casa, o “canard à la presse”. O segredo consistia no serviço. Saber compreender que o que se vende é a satisfação do cliente revela-se uma estratégia crucial de contornos imprescindíveis e com carácter de urgência para qualquer sector de atividade económica que aspire ser bem-sucedido no concorrencial mundo dos negócios. O verdadeiro “welcome” não é mais do que a capacidade, por parte de quem recebe, de fazer com que o cliente se sinta como em sua casa. De forma excepcional, no La Tour d`Argent cada cliente, cada entidade, contam. Um cliente satisfeito aspira sempre regressar; faz questão de levar consigo alguns amigos, que por sua vez cativam mais e mais convivas. Contrariamente, um cliente desagradado provoca uma avalancha de desconsideração incontrolável que, num volte face, destruirá o prestígio de um restaurante, com as inevitáveis repercussões catastróficas sob o ponto de vista financeiro, não apenas para o seu proprietário, e por arrastamento, para a vida profissional e pessoal de toda uma equipa de colaboradores e seus correlativos. O segredo consiste, pois, em estender o tapete vermelho a todos os clientes, exatamente por ser assim que também nós gostaríamos de ser tratados.



Próximo capítulo...

O desafio que a seguir lhes proponho consiste num convite: o de se deixarem fazer guiar por mim durante uma visita ficcionada a um restaurante (que resolvi designar de Exemplar), cujos personagens intervenientes são igualmente imaginários, para que a tentativa por parte do leitor em estabelecer uma eventual conotação com alguma situação real por si vivenciada, se dissipe de imediato, pese embora o facto de esta incitação ter sido fundamentada em situações autênticas por mim experimentadas ao longo de um percurso profissional que considero ter sido suficientemente enriquecedor para poder emitir um parecer imparcial. Assim, convido-o, a partilhar os meus pensamentos, emoções e mais deliberadas convicções relativamente a uma matéria que considero ser de importância suprema. Portanto, e como já referi, a ideia consiste em viajarmos ao encontro de um cenário inventado e com epicentro focalizado a partir da primeira abordagem por parte de um cliente que pretenda reservar mesa para jantar, passando de seguida ao espaço temporal em que refeição propriamente dita supostamente decorre, até ao momento final, quando os comensais saem do restaurante.

Leia o capítulo II, deste maravilho artigo brevemente aqui no "Oinos sem Mistério."
Fonte: João Pires – Master Sommelier 

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