É Sommelier? Foi Sommelier? Quer se tornar um sommelier de sucesso? Uma Taça de Oinos com o Master João Pires - Capítulo II
O desafio que a seguir lhes proponho
consiste num convite: o de se deixarem fazer guiar por mim durante uma visita
ficcionada a um restaurante (que resolvi designar de Exemplar), cujos
personagens intervenientes são igualmente imaginários, para que a tentativa por
parte do leitor em estabelecer uma eventual conotação com alguma situação real
por si vivenciada, se dissipe de imediato, pese embora o facto de esta
incitação ter sido fundamentada em situações autênticas por mim experimentadas
ao longo de um percurso profissional que considero ter sido suficientemente
enriquecedor para poder emitir um parecer imparcial. Assim, convido-o, a
partilhar os meus pensamentos, emoções e mais deliberadas convicções
relativamente a uma matéria que considero ser de importância suprema. Portanto,
e como já referi, a ideia consiste em viajarmos ao encontro de um cenário
inventado e com epicentro focalizado a partir da primeira abordagem por parte
de um cliente que pretenda reservar mesa para jantar, passando de seguida ao
espaço temporal em que refeição propriamente dita supostamente decorre, até ao
momento final, quando os comensais saem do restaurante.
{O ATENDIMENTO AO TELEFONE }
Mr. Smith (Mr.S.) - Olá muito boa tarde! O meu nome é Adam Smith.
Se possível, gostaria de reservar uma mesa de quatro lugares para amanhã, às
20h, por favor.
Restaurante Exemplar (R.E.) – Só um momento por favor; vou
encaminhar a sua ligação para a pessoa responsável pela marcação de reservas.
A pessoa certa é sempre a que
estabelece o primeiro contacto. Deixar um potencial cliente à espera, ao
telefone, consiste num erro crasso, pois deixa transparecer uma imagem negativa
do estabelecimento. Ainda que não seja a responsável por essa função, a pessoa
que atende a chamada deverá estar perfeitamente treinada, de forma a poder recolher
todos os dados inerentes ao pedido formulado pelo cliente, garantindo-lhe de
imediato um posterior contacto de reconfirmação. Não transfira responsabilidades
para terceiros. Evite a todo o custo que o cliente fique “pendurado” do outro
lado da linha. Lembre-se sempre: a primeira imagem que perpassa potencia a
possívelfidelização do cliente, assim como o êxito do designado efeito “bola de
neve”. O ideal será providenciar uma linha telefónica que permita que o cliente
contacte directamente com o(a) responsável pelas reservas.
R.E. – (Dois minutos depois, quando não mais, eis que finalmente
chega “a pessoa responsável pela marcação de reservas”) – Está sim, boa tarde;
em que posso ser útil? Reserva para amanhã? Impossível! Estamos cheios. Não há
impossíveis. Existem, isso sim, algumas condicionantes. E que tal responder
apresentando sugestões, ou eventuais soluções que, tanto quanto possível,
possam ir ao encontro do que o cliente pretende ver concretizado? Aconselhar,
por exemplo, uma data alternativa ou, ainda, recomendar um outro restaurante
com características semelhantes e localizado nas proximidades.
Mr.S. – E para a semana qual a vossa disponibilidade?
R.E. – Para a semana… (hesitação). Sim, pode ser, mas… (nova
hesitação) … só quinta-feira, às 21h. Seria possível facultar-me um contacto
telefónico?
R.E. – Até quinta-feira.
Enquanto cliente, pessoalmente
ficaria bastante mais satisfeito se me agradecessem pela reserva efetuada e, completamente,
se se disponibilizassem para que me fosse prestado mais algum esclarecimento adicional,
susceptível de poder vir a revelar-se útil. Clientes, porventura menos
esclarecidos nos domínios da gastronomia e das bebidas. Seja perspicaz tentando
“adivinhar” antecipadamente quando estiver na presença de alguém que não
consome bebidas alcoólicas, prontamente sugestionando-lhe como alternativa “soft
drinks”, para que nunca se sinta embaraçado e, de certa forma, até mesmo
intimidado, pois se revela imperioso para estes clientes que percebam que essa
particularidade em nada afeta a sua integridade, antes pelo contrário,
permitir-lhes-á percepcionar rapidamente a enorme importância de que se reveste
para o restaurante todo o seu potencial enquanto clientes, posicionando-os em
igualdade de circunstâncias com os demais frequentadores que ali se deslocaram
e pretendem que aquele momento seja simplesmente memorável. Muito importante
também: tratando-se de um cliente abstêmio aproveite o ensejo para,
simultaneamente perguntar se existe alguma intolerância ao álcool, obviamente,
se alguma das sobremesas contiver licores ou rum, por exemplo, como frequentemente
acontece. Não seja demasiado técnico, a não ser que tal requisito se revele um
imperativo ou tenha a certeza de que se trata de alguém em concreto que conhece
e aprecia este tipo de preciosismo. Desta forma, evite propor um champanhe
“blanc de blancs” não datado. Em alternativa, sugira um champanhe leve, frutado
e fresco como aperitivo. E, muito importante, também: nunca abandone a mesa sem
agradecer.
Mr.S. – Desculpe o “Cardápio de Degustação” só está disponível para
toda a mesa?
R.E. – Não, de forma alguma Mr. Smith. Aliás, se algum dos pratos
não for do agrado dos senhores, dispomos de várias alternativas possíveis que,
com toda a certeza, o chefe terá o prazer de confeccionar e que certamente
corresponderá às melhores expectativas dos senhores. Flexibilidade é sinónimo
de qualidade. Esta questão dos menus de degustação só estarem disponíveis para
a totalidade da mesa já não se justifica. Não vai ao encontro do designado
“custommer orientated”, apesar de ser perfeitamente possível e apenas se verificar
com o intuito de proteger o chefe em detrimento do único objetivo que aqui
convém ressalvar: a total satisfação do cliente. Por ser infundado, semelhante
desempenho é pertença do passado. Dá mais trabalho? Ah, sem dúvida!
Mr.S. – Perfeito! Assim, pretendemos um cardápio de degustação para
mim e outro para a minha esposa. Para o meu filho, a escolha será feita “à la
carte”. A minha nora é vegetariana. Seria possível providenciar um cardápio
especial para ela, por favor?
R.E. –Com certeza Mr. Smith. A nossa sugestão é... Permita-me
apenas que primeiro me certifique se existe alguma restrição. Por exemplo, a
frutos secos; ou uma possível intolerância: a lactose? E a glúten? Estas
perguntas são fundamentais sendo, no entanto, natural que outras restrições
possam também coexistir. É preciso ter alguma sensibilidade para com certas
etnias cujas crenças, superstições e/ou orientações religiosas, sobremaneira
difundidas, proíbem o consumo de carne de porco ou vaca, por exemplo. Saber que
não se deve recomendar álcool a árabes no período do Ramadão. Questionar sempre
se as senhoras grávidas apresentam restrições relativamente à ingestão de alguma
bebida, alimento ou tempero é igualmente de capital importância. Certifique-se
que as surpresas do chefe, como os amuse bouche, não constituem perigo algum
para a salvaguarda da saúde dos clientes. Por não constarem do cardápio poderão
fazer despoletar esse risco. E, já agora, evite apresentá-los como tal. Ao
invés de... ”Este é o nosso amuse bouche...’’, preferencialmente enuncie...’’uma
pequena entrada com os cumprimentos do chefe …(cite o nome)’’, dignificando
desta forma um momento que se pretende tão exclusivo quanto o inestimável,
embora efémero período de tempo em que, sozinho ou acompanhado, a sagração de uma
refeição transcorre, apenas consegue proporcionar.
{ O MOMENTO DA RECEPÇÃO DOS
CLIENTES, A CHEGADA AO RESTAURANTE }
Nunca pergunte se tem reserva,
porque na eventualidade de o cliente não ter procedido à marcação de reserva
deixará transparecer a desagradável sensação de que não é bem-vindo. Normalmente,
o cliente que efetuou reserva acusa-se de imediato. Alternativamente, pergunte
se teve a oportunidade de reservar mesa com antecedência. Poderá ainda usar a seguinte
técnica, entrepondo com subtileza: - “Por favor, recorde-me em que nome reservou
mesa?’’ Assim, de uma forma bastante mais elegante, obterá a resposta
pretendida.
R.E. – A mesa está pronta, sigam-me, por favor. Não está mal, mas
pode ser dito de forma ainda melhor. O que acha se cortesmente disser: -‘’ A
vossa mesa está pronta. Permitam-me que os acompanhe’’.
{ NO RESTAURANTE }
Mr.S. – Peço desculpa mas não gosto da localização desta mesa.
Seria possível sentarmo-nos numa outra, junto à janela?
R.E. – Com certeza. Agrada-lhes aquela, posicionada no canto, ao
fundo da sala de jantar, de onde poderão desfrutar de uma magnífica perspectiva
sobre a cidade? É quase sempre possível mudar de mesa, devendo ser apresentada
uma alternativa, principalmente se a hora a que a reserva foi efetuada
coincidir com o início da operação. Não há nada mais embaraçoso para o cliente
que chega cedo, com a sala ainda praticamente vazia, do que ver ser-lhe
recusado um pedido do género.
R.E. – Muito bem. Posso sugerir-lhes um aperitivo? Aproveite a
oportunidade proporcionada por este fugaz, mas precioso compasso de espera para
quebrar o gelo: por exemplo, pergunte se tiveram alguma dificuldade em chegar
até ao restaurante, caso se trate de uma primeira visita. Ou, afiance
convictamente que está uma noite agradável. Só então aconselhe um aperitivo,
não devendo esquecer-se que será por si sugerido algo de concreto. Proponha sempre
duas, talvez mesmo, três alternativas, na eventualidade de as primeiras não
surtirem efeito. Seja rápido mas conciso e acessível sem nunca negligenciar o fator
simpatia. Oriente os, porventura menos esclarecidos nos domínios da gastronomia
e das bebidas. Seja perspicaz tentando “adivinhar” antecipadamente quando estiver
na presença de alguém que não consome bebidas alcoólicas, prontamente sugestionando-lhe
como alternativa “soft drinks”, para que nunca se sinta embaraçado e, de certa
forma, até mesmo intimidado, pois se revela imperioso para estes clientes que
percebam que essa particularidade em nada afeta a sua integridade, antes pelo
contrário, permitir-lhes-á percepcionar rapidamente a enorme importância de que
se reveste para o restaurante todo o seu potencial enquanto clientes, posicionando-os
em igualdade de circunstâncias com os demais frequentadores que ali se
deslocaram e pretendem que aquele momento seja simplesmente memorável. Muito importante
também: tratando-se de um cliente abstémico aproveite o ensejo para,
simultaneamente perguntar se existe alguma intolerância ao álcool, obviamente,
se alguma das sobremesas contiver licores ou rum, por exemplo, como
frequentemente acontece. Não seja demasiado técnico, a não ser que tal
requisito se revele um imperativo ou tenha a certeza de que se trata de alguém
em concreto que conhece e aprecia este tipo de preciosismo. Desta forma, evite
propor um champanhe “blanc de blancs” não datado. Em alternativa, sugira um
champanhe leve, frutado e fresco como aperitivo. E, muito importante, também:
nunca abandone a mesa sem agradecer. Mr.S. – Desculpe o “Cardápio de
Degustação” só está disponível para toda a mesa?
R.E. – Não, de forma alguma Mr. Smith. Aliás, se algum dos pratos
não for do agrado dos senhores, dispomos de várias alternativas possíveis que,
com toda a certeza, o chefe terá o prazer de confeccionar e que certamente
corresponderá às melhores expectativas dos senhores. Flexibilidade é sinónimo
de qualidade. Esta questão dos menus de degustação só estarem disponíveis para
a totalidade da mesa já não se justifica. Não vai ao encontro do designado
“custommer orientated”, apesar de ser perfeitamente possível e apenas se
verificar com o intuito de proteger o chefe em detrimento do único objetivo que
aqui convém ressalvar: a total satisfação do cliente. Por ser infundado, semelhante
desempenho é pertença do passado. Dá mais trabalho? Ah, sem dúvida!
Mr.S. – Perfeito! Assim, pretendemos um cardápio de degustação para
mim e outro para a minha esposa. Para o meu filho, a escolha será feita “à la
carte”. A minha nora é vegetariana. Seria possível providenciar um cardápio
especial para ela, por favor?
R.E. –Com certeza Mr. Smith. A nossa sugestão é... Permita-me
apenas que primeiro me certifique se existe alguma restrição. Por exemplo, a
frutos secos; ou uma possível intolerância: a lactose? E a glúten? Estas
perguntas são fundamentais sendo, no entanto, natural que outras restrições
possam também coexistir. É preciso ter alguma sensibilidade para com certas
etnias cujas crenças, superstições e/ou orientações religiosas, sobremaneira
difundidas, proíbem o consumo de carne de porco ou vaca, por exemplo. Saber que
não se deve recomendar álcool a árabes no período do Ramadão. Questionar sempre
se as senhoras grávidas apresentam restrições relativamente à ingestão de
alguma bebida, alimento ou tempero é igualmente de capital importância.
Certifique-se que as surpresas do chefe, como os amuse bouche, não constituem
perigo algum para a salvaguarda da saúde dos clientes. Por não constarem do cardápio
poderão fazer despoletar esse risco. E, já agora, evite apresentá-los como tal.
Ao invés de... ”Este é o nosso amuse bouche...’’, preferencialmente enuncie...’’uma
pequena entrada com os cumprimentos do chefe …(cite o nome)’’, dignificando desta
forma um momento que se pretende tão exclusivo quanto o inestimável, embora efémero
período de tempo em que, sozinho ou acompanhado, a sagração de uma refeição
transcorre, apenas consegue proporcionar .
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Fonte: João Pires - Master Sommelier