ESCANÇÃO OU SOMMELIER?

José Carlos Santanita -  Foto tirada no
 decorrer da final  do Troféu Ruinart em 1999
Portugal 
Na prática, um Sommelier ou um Escanção é um garçom especializado em bebidas, com a diferença e a importância de cada um na história, que explicarei abaixo. Nos dias de hoje o Escanção tornou-se um técnico imprescindível na maioria dos estabelecimentos que trabalham com bebidas, seja na comercialização ou na produção. Hoje este profissional atua nas mais diversas áreas (importadores, lojas, supermercados e produtores de vinho, etc.). Há sete anos, fui criticado por alguns experts do mundo do vinho, por afirmar que o Escanção era uma peça fundamental na comercialização e divulgação do vinho e que não poderia ser visto somente como um garçom de restaurante. 
Mas a bem da verdade a origem desta nobre profissão tem a ver com o serviço, no entanto hoje todos aqueles que me criticaram renderam-se a importância que este profissional tem, junto do consumidor de vinhos da atualidade.   
Um Sommelier ou um Escanção que passou pela hierarquia correta de seu trabalho e de seus estudos, tem na pureza e na essência o maior desafio de humildade que um ser humano pode ter. Ser Escanção é ter o desafio diário de proporcionar prazer e felicidade aos outros. Assim como fazer um alimento é uma forma de transmitir amor aos outros, é o Escanção o cupido que faz com que esta união resulte.  
Este profissional desempenha um dos papéis mais importantes no cenário ou na orquestra em que o vinho é o seu principal instrumento. É um grande “relações públicas”, um grande ator e abraça em todos os minutos do seu dia diferentes papéis num filme que é real e é vivido ao segundo. O escanção transforma-se e adapta-se ás circunstâncias como um camaleão e com simplicidade consegue unir a sua cultura a experiência vivida por algum dos seus clientes.
Ser um grande Escanção ou Sommelier, além da técnica, que é conhecida por todos, é ser o poeta do vinho. É ser aquele que declama uma grande poesia, que na maioria das vezes é declamada sem dizer uma só palavra... É ser bailarino de Balet, porque caminhar num salão não é para todos, é ser um oficial da Marinha, porque sabe o significado das palavras respeito, ordem e disciplina, além disso, sabe delicadamente obedecer. É nunca julgar um vinho! É proporcionar momentos com vinhos. Ser Escanção ou Sommelier é o maior símbolo entre a mestria de unir a alma da gastronomia ao espírito de um vinho.
Estas palavras que escrevi são em minha opinião a mais perfeita forma para se classificar um Escanção ou um Sommelier. Infelizmente nos dias que correm estamos bem distantes do que acabo de descrever. Ao contrário da gastronomia, que evoluiu, os serviços de vinho pioraram e hoje estes NOBRES senhores estão confundidos num cenário pouco atrativo. Hoje se confunde vaidade com amor a arte, hoje pouco existe o “Saber – Saber | Saber – Fazer”.

 Num passado bem recente (20, 30 anos atrás) todos os profissionais que entravam num salão de restaurante para trabalhar, eram escolhidos a dedo e nem todos tinham o privilégio de estar perante a cultura de um cliente. No passado os diretores de um restaurante eram pessoas que sabiam de turismo e hoje essa responsabilidade não passa de caprichos de alguns, que acham que fazer turismo tem as regras nas suas próprias vontades e invenções. Acho que me fiz entender...
 Então, e a bem da verdade o que se têm visto nestes 30 anos de democracia é na verdade uma grande anarquia do turismo. Hoje não se dá o devido valor a um técnico e todos acham que ter um canudo por baixo do braço é o mais importante. Um diploma de qualquer área serve para dar aulas de turismo ou serviços. Interessante, não acham? Um médico ou um jornalista dar aulas de serviço técnico de vinho só porque fez umas viagens e provou uns vinhos inacessíveis a maioria dos mortais... Vimos isso todos os dias nas mais diferentes áreas. Infelizmente já não se escolhe a dedo um Garçom. Como dizia um diretor que conheci “Tem pernas? Tem braços? Pode vir trabalhar já amanhã?” Nos dias de hoje ninguém prepara equipes, ninguém vê a importância de um bom garçom. E quem vende vinhos? Quem vende vinhos meus amigos é a equipe, nunca um Escanção ou um Sommelier sozinho e isolado no seu pedestal de cristal. Além de tudo isto meus caros amigos, vemos tudo trocado. Jornalistas que não são jornalistas de formação, sommeliers que não são sommeliers por vocação, intitulados professores que nunca tiveram na vida um módulo de pedagogia para lecionar, entre outras coisas que todos os experts em vinho já sabem a resposta.
Qual é o caminho para melhorar?
  1.    Deixar de ver a educação como um custo.
  2.     Investir e apostar numa qualificação técnica, séria e bem direcionada. 
  3.     Educação com metas e objetivos bem definidos.
  4.     Os empresários devem apostar na educação e formação das suas equipes.
  5.    Os produtores e importadores devem de deixar de dar lavagens cerebrais com marcas e começar realmente a proporcionar formação qualificada e séria feita por pessoas neutras.
  6.    As escolas devem contratar técnicos qualificados ao invés de doutores desqualificados para dar aulas técnicas.
  7.  Os profissionais devem apostar na sua educação e deixar de ver a educação como um custo desnecessário.

Hoje com mais de 20 anos de carreira tenho prazer e a responsabilidade em passar meu conhecimento. Tenho prazer em ver sucesso naqueles que assim como eu iniciaram uma aventura numa das profissões em que a grande qualidade se chama cultura. Gosto de ver aqueles que não encontram desculpas para não conseguir, gosto e admiro aqueles que tentam e que lutam pelos seus objetivos de forma justa e honesta. Nunca esqueçam que ter sucesso é diferente de ser famoso e carreira é diferente de um momento...
 Passei mais da metade da minha carreira no salão e na cozinha de um restaurante e sempre amei a minha profissão. Tinha orgulho no meu fardamento e zelava acima de tudo pelo meu cliente. Vivi numa região de Portugal carente em escolas, livros e a tudo o que fosse educação, participei na revolução turística dessa região. Formei-me ao lado de pessoas que sabiam de turismo e que viam este trabalho como um prazer de dar felicidade aos outros. Apostei na minha educação como principal investimento e corri o mundo pra isso.  Aprendi que o meu tempo é o meu maior investimento e corri atrás dele. Hoje sei que nada sei! E o vinho é mesmo isso, nunca se sabe nunca se supõe, nunca é exato e nunca se avalia na totalidade. 
O vinho é Sangue de Cristo, oferecido pela mãe natureza. E é ela que determina sem avaliar ou cobrar todos os anos uma nova história. É essa constante busca de conhecimento que me alimenta a alma e é por isso que amo o meu trabalho.
No início deste post, escrevi uma frase “Que diferença existe entre um Escanção e um Sommelier” Na verdade e na prática não existe nenhuma diferença a não ser na forma como se pronúncia assim como na sua história. Eu como qualquer português sou filho de Roma e tenho o Latim na minha história e na minha língua e por isso sou Latino.
A palavra Escanção vem de Scancio (personagem que Escancionava vinhos na antiga Roma)
Se verificarmos as hierarquias de conceituadas confrarias gastronômicas Ex: Chaine des Rôutisseurs (a maior e mais importante confraria de gastronomia do mundo) reparamos que eles utilizam a palavra “Echanson” – traduzindo - Era um oficial que servia bebida a um Rei, príncipe ou outra pessoa de alto escalão na corte.
Devido ao medo constante de tramas e conspirações, o cargo era entregue a um oficial da maior confiança do Rei. Normalmente um cavaleiro da corte. Isso evitava qualquer risco de intoxicação e até mesmo provar o vinho antes de servir. Em Portugal alguns enólogos de renome internacional têm o Privilégio de ser o ECHANSON – ESCANÇÃO da renomada confraria mencionada.
Vejam este site: http://www.echansons.com/qui-sommes-nous/ Conseil Des Échansons de France e vejam este também da confraria que comentei: http://www.chainedesrotisseurs.com/

O mais interessante é que alguns profissionais que desempenham a função de Echanson nestas confrarias de elite,acham que os portugueses deveriam também ser chamados de Sommeliers e deixar de se chamar Escanções!
Aqui fica a história da origem da palavra “Sommelier”:


A palavra Sommelier vem do francês [bête de] somme = [besta de] carga + lier = amarrar, ligar, portanto o "amarrador” (ou lidador) das cargas". Em resumo, o carroceiro dos castelos e palácios, que, por transportar as pipas de vinho, acabou sendo incumbido de provar seu conteúdo antes que fosse servido aos Reis e nobres, para evitar tentativas de envenenamentos durante o transporte. (Dados retirados de alguns sites da Internet).

Agora analisem os textos abaixo:
O ESCANÇÃO – SUA ORIGEM ATÉ AOS TEMPOS MODERNOS
(Trabalho de pesquisa realizado por Joaquim Santos)
Através de inúmeras citações em escritos antigos e textos bíblicos, conhecem-se testemunhos que comprovam a existência e nobreza do Escanção.

Na mitologia grega encontramos a deusa Hebe, filha de Júpiter e de Juno, encarregada de servir aos deuses do Olimpo, o néctar e a ambrósia.
Nos tempos bíblicos, vimos que o Escanção era um grande oficial a quem, os soberanos tinham em alta estima e consideração.

Na época romana, o lugar de Escanção era exercido por efebos dotados de boa aparência física e qualidades gustativas.

Na corte de Carlos Magno, existia o Escanção – Mor, cuja autoridade era respeitada por todos.

Em França, o primeiro Escanção foi instituído por Henrique I em 1060, de seu nome Hugo.

Na época de Luís VIII, o Escanção ocupava o segundo lugar na hierarquia da corte, o Escanção mantinha sob sua autoridade gentis homens, a fim de servirem o rei e nas cerimônias solenes.

Em todas as casas reinantes da Europa, existia o Escanção, exercido por personalidades de alta linhagem.

Na corte Inglesa, o Escanção usufruía de uma comissão sobre os vinhos importados.

Em Portugal:
No reinado de D. Afonso Henriques, foi seu Escanção Fernão Perez, cavaleiro que gozava do maior prestígio na corte. Na crônica de D. Sancho II, cita-se Martim Moniz como seu Escanção – Mor. Tanto neste reinado como no de D. Afonso II, o Escanção dispunha de dois homens para o ajudarem, costumava receber três quartas de vinho.

Logo que aclamado Rei, em 1385 D. João I Mestre de Aviz, previu os oficiais da sua casa, entre tais oficiais figurava o Escanção.

Nos tempos atuais, a função do Escanção democratizou-se, quem atualmente ostenta tão honroso titulo, não possui pergaminhos de nobreza.
O Escanção notabiliza-se pelo requinte com que trata essa bebida tão nobre que é o vinho que temos e damos a beber.

O Escanção moderno, estuda, aprende línguas, atualiza-se se informa, frequenta seminários, colóquios, palestras da sua especialidade, Concursos Nacionais e Internacionais. Conhece as principais castas das uvas, é perito em vinhos e outras bebidas, conhece a gastronomias nacional e internacional.
O Escanção transmite o seu saber.
Ao Escanção exige-se, para além de “Amar a vida o bom vinho”...
Então e como dizia o grande Luiz Gonzaga. “Se eu nascesse de novo e pudesse escolher, mais do que sou não queria ser!” Eu sou Escanção com muito orgulho. Saúde!
 José Santanita 






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